quinta-feira, 23 de abril de 2009

Viva Ará Café de portas abertas


A inventividade de Paulo Lobo está brindando o aracajuano com um espaço cultural sem semelhantes nesta cidade tão carente. Há poucos dias, ele abriu as portas do Viva Ará Café, uma espécie de mini-teatro acoplado a um barzinho aconchegante e até inspirador. Local de boêmios natos, mas também de pretos nobres, velhos safados, deputado marajá, senhora de idade, moço trabalhador, dondoca doideca, além das falsas baianas que andam soltas por aí.
Aliás, Paulo Lobo tornou-se em Sergipe o único artista que tem sua própria casa de shows. É independência total. E isso acabou fazendo um bem danado aos demais músicos que precisam mostrar seu trabalho, seja ele autoral ou não, e dificilmente encontram espaço adequado por aqui. A casa, que funciona na rua Américo Curvelo, antigo Al Bar, tem espaço para umas cem pessoas sentadas. É pequenininha, mas ideal para acolher os artistas com vontade de mostrar no palco um pouco daquilo que sabem fazer muito bem por aqui. Vale à pena conferir.

Gilson Sousa

sábado, 18 de abril de 2009

Solidários na miséria


Chico Ribeiro Neto (chicoribe@gmail.com) é jornalista

A menina de rua dava restos de sua comida (que já eram restos) ao cachorro com tanta dedicação que aquilo me emocionou. E me lembrei de quantas vezes já vi mendigo acompanhado de dois ou três cachorros, que não o largam por nada. Outro dia vi um catador de papel dormindo na Barra com dois cães ao lado, como verdadeiros guardiães.
Os cães têm o mesmo aspecto dos mendigos, desdentados, sofridos e famintos. Eles estão cada vez mais próximos, pois há uma solidariedade na miséria.
Cachorro e cachaça, dois amigos do mendigo. Vinicius de Moraes conseguiu juntar os dois quando disse ser o uísque o melhor amigo do homem, pois é “o cachorro engarrafado”.
Praticamente descrentes do ser humano, de algum gesto de amizade ou carinho, os mendigos se apegam mais aos cães. Deles, não há desconfiança. São amigos no abandono.
Outro dia vi também, na Barra, uma mulher chamando para dentro a cadelinha que estava na calçada, numa paquera com um cão: “Entre, minha filha, eu já lhe disse que não é pra andar com qualquer um. Não faça mais isso, viu? Vamos logo, puxa pra dentro”. Obediente, a cadela entrou. Como se diz, “cada qual com seu cada qual”.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Saudade dos cadernos culturais de Aracaju


Gilson Sousa

Que falta faz um bom suplemento ou caderno cultural nesta cidade cheia de respeitáveis literatos. Há anos Aracaju deixou de contar com o privilégio de possuir uma dessas publicações que servem de desaguadouro da produção em prosa e versos de centenas de pessoas muito ligadas às palavras. Sendo assim, é necessário evocar aqui todos os méritos a dois grandes empreendedores culturais que um dia deram esta oportunidade a tantas e tantos que burilavam na inspiração com a certeza de que poderiam expor ao leitor sua constante produção textual. Um viva bem entusiasmado para José Abud e Célio Nunes.
Abud, durante quase toda a década de 1980, dividiu sua tarefa de médico com a de editor do ArteLiteratura, caderno publicado aos domingos na extinta Gazeta de Sergipe. Era feito de forma artesanal, mas recheado de poemas, contos, ilustrações, ensaios e outros textos que deliciavam os leitores assíduos do suplemento. Naquelas páginas em preto e branco, nomes desconhecidos do público e outros já consagrados na literatura local desfilavam sua arte. A publicação, que nem de longe se preocupava com a questão comercial, era exclusivamente dedicada à literatura local.
Pelas centenas de edições do ArteLiteratura passaram nomes como
Jaime Norberto da Silva, Mauricio Santos Oliveira, Dílson Ramos, Araripe Coutinho, José Carlos Torres, Jonas Santana Filho, Roberto Mozart, Núbia Marques, Ofenísia Freire, Antônio Alvino Argollo, Aderbal Bastos Barroso, Eugênia Freire, Emmanuel Franco, Eunaldo Costa, Sônia Barreto, Santo Souza, Nairson Marinho Souza, Rosivaldo Nascimento, Lídia Dantas, Jeová Santana e até eu próprio, quando comecei a revelar ao mundo alguns poemas de iniciante. Outros tantos nomes, devidamente tratados com respeito por José Abud, figuravam com freqüência no jornal que deixou de existir ainda no final de 1988.
Em novembro de 1990 uma atitude corajosa do jornalista Célio Nunes, então diretor geral do extinto Jornal da Manhã, hoje Correio de Sergipe, trouxe de volta a alegria dos literatos até então de luto. Naquele mês foi publicado o primeiro número do suplemento cultural Arte & Palavra. Muito mais que uma preciosidade, aquilo era uma necessidade sem dimensão para os poetas, contistas e demais escritores que habitavam em Sergipe. E já na primeira página os editores davam o recado: “A nossa tentativa não deixa de ser audaciosa e arriscada, sobretudo por estarmos numa terra onde, em termos culturais, mesmo se plantando, nem sempre dá. Que o tempo não nos seja breve”.
Recado dado, o suplemento seguiu adiante. O primeiro Conselho Editorial foi formado pelo professor e contista Antônio Carlos Viana na presidência, tendo ainda Jeová Santana, Ana Valença, Paulo Afonso Cardoso, o próprio Célio Nunes, contista de mão cheia, e este jovem escriba no papel de aprendiz. O Arte & Palavra não tinha a pretensão de substituir o ArteLiteratura de José Abud, mas sim oferecer aos escritores daqui e até de fora do Estado um espaço privilegiado para divulgação de sua obra escrita.
Textos de Iara Vieira, Jackson da Silva Lima, Wilton James, Gizelda Morais, Juraci Costa de Santana, Luiz Eduardo Menezes de Oliveira, Djanira Pio, Paulo Fernando Teles de Morais, Luiz Antônio Barreto, Ilma Fontes, Manoel Cardoso, Hunald de Alencar, Antônio Passos de Souza, Léo Mittaraquis, Jane Ribeiro Lisboa, eram vistos com freqüência no jornal. Além destes, os acadêmicos Sonia Maria Machado, Antônio Ponciano Bezerra, Francisco José Alves dos Santos, Simone Menezes Costa de Santana, Maria Matilde dos Santos, entre outros, publicavam seus ensaios literários nas páginas do Arte & Palavra que também republicava textos clássicos da literatura sergipana de Tobias Barreto, Silvio Romero e outros.
Este suplemento resistiu por pouco mais de dois anos. Aliás, é bom frisar que a resistência era mesmo de Célio Nunes, que à época enfrentava a ganância absurda da família de João Alves Filho, proprietária do jornal, pela obtenção de lucros com o caderno. “Os dividendos são culturais”, respondia sempre o velho Célio, para desespero de dona Maria do Carmo, responsável direta pela morte do espaço. Daí então, caro leitor, resta-me confessar a saudade de tais publicações e tirar mais uma vez o chapéu para figuras imprescindíveis como José Abud e Célio Nunes.

PS: Texto originalmente publicado na Foha da Praia.

domingo, 12 de abril de 2009

Futebol no brejo


Dia desses, vi no blog de Dilson Ramos (www.dilsonramosjc.blogspot.com) elogios rasgados ao time de futebol da cidade de Tobias Barreto, Sete de Junho, que disputa o quadrangular do campeonato sergipano com Confiança, Sergipe e Itabaiana. Concordei com os elogios, já que o time interiorano é líder absoluto do torneio e vem demonstrando certo equilíbrio dentro de campo.
Hoje, domingo de Páscoa, vi pela Aperipê TV justamente o jogo entre Sete de Junho e Confiança, meu time. Aí confesso que fiquei triste. Não somente pelo jogo bisonho que acabou 3 a 2 para o Sete. Mas principalmente pelo campo de jogo em Tobias Barreto, chamado de Brejeirão. A propósito, o que esperar de um campo chamado de Brejeirão? Uma porcaria, né.
Pois bem. Como não anda chovendo em terras sergipanas, o campo em referência tem mais terra batida que gramado. É uma poeira desgraçada subindo a cada toque na bola. Uma agressão à saúde dos jogadores profissionais. Aliás, um acinte ao profissionalismo, já que aquele campo mal serve para peladas de final de semana. E esse acaba sendo o retrato do nosso futebol.
Por fim, digo apenas que os jogadores guerreiros deste campeonato tão pobre mereciam campo melhor para atuar. A Federação Sergipana de Futebol, que parece só existir no papel, bem que poderia exigir um pouco mais dos dirigentes e poder público. É vergonhoso ver, quanto mais jogar num troço daquele. E assim fica tudo cada vez mais feio no nosso futebol de terceira.

Gilson Sousa

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Silvio Rocha: acordes e lentes a serviço da arte em Sergipe


Música e fotografia. Som e imagem convivendo em harmonia com os acordes e lentes de Silvio Rocha, um artista aracajuano nascido em outubro de 1965 e que hoje sabe conciliar como ninguém o encanto do violão e a força da linguagem fotográfica. Filho do saxofonista Argemiro Ribeiro Oliveira, responsável pela montagem da banda do Corpo de Bombeiros em Sergipe, Silvio se envolveu com a música quando ainda era criança e acompanhava os encontros de um grupo musical liderado por seu pai. “Eles participavam de um regional e todo sábado à tarde ensaiavam lá em casa para tocar nas casas noturnas daquela época, que eram justamente os cabarés”, lembra.
O primeiro instrumento que caiu em suas mãos, curiosamente, foi um tambor, já que o pai também tocava sopro na charanga que acompanhava os jogos do Confiança no Batistão. Em seguida, o menino Silvio Rocha experimentou um piston, mas na adolescência ficou encantado mesmo foi com o som do violão, instrumento que aprendeu a dominar sem muita dificuldade, mesmo sem ter freqüentado escola de música. “Minha mãe, Elvira Rocha, não queria que eu fosse músico, mas sempre gostei de cantarolar e tive que contrariar a vontade dela”, confessa o artista.
Em 1991 gravou o LP Brasa Brasil, seu único trabalho autoral. “Era um vinil que demorou quase dois anos para chegar em Aracaju depois da gravação em Recife e prensagem em São Paulo. Naquele tempo era uma luta”, relembra Silvio. Em 2003 veio o cd ‘emepebeando’, com um repertório eclético da MPB, mas com a irreverência e alegria que caracterizam Silvio Rocha. O disco foi gravado ao vivo no extinto bar Melodia, em Aracaju, e chegou a vender mais de 5 mil cópias. Em 2005 investiu no forró autêntico e gravou a coletânea junina ‘O melhor do pé de serra’.
Hoje Silvio Rocha é um dos mais requisitados cantores da noite aracajuana, mas revela que tudo começou pra valer aos 20 anos de idade, quando foi convidado para tocar no bar A Cabana, na Atalaia. “O problema é que eu só tinha um repertório com 15 músicas, mas o dono do bar me incentivou a aprender outras e eu fui em frente”, diz. Silvio confessa ainda que sua grande influência musical tem base nos músicos locais que faziam sucesso na década de 1980, como Antônio Carlos do Aracaju, Cataluzes, Grupo Repente e outros.
Naquela mesma época, por volta de 1979, Silvio Rocha começava sua vida de fotógrafo profissional com um emprego no Instituto de Identificação, fazendo fotos para carteiras de identidade, além de imagens de cadáveres no Instituto Médico Legal e de presos em delegacias de policia. Mais tarde foi convidado para trabalhar em jornais, com passagens pelo extinto Jornal de Sergipe, Gazeta de Teresópolis (RJ), Jornal da Cidade e Cinform. “Mas nesse tempo todo eu consegui trabalhar com a fotografia e a música. Nunca passei um longo tempo sem trabalhar conciliando as duas coisas. Sempre estiveram muito presentes em minha vida”.
O artista tem planos de gravar em breve um dvd com alguns trabalhos autorais e um bom bocado de músicas conhecidas do público e que fazem sucesso na sua voz, como ‘Avohai’ de Zé Ramalho e ‘Telegrama’ de Zeca Baleiro. Na fotografia ainda sonha com uma nova exposição numa área com grande concentração de pessoas. “Essas duas artes me proporcionam tanta alegria que nos meus trabalhos sempre tento traduzir isso com muita expressividade, muita alegria mesmo. É uma forma de agradecer porque a música é uma das mais sublimes artes que temos e a fotografia é um encanto que marca”.
Silvio Rocha se queixa apenas da falta de locais apropriados em Aracaju para mostrar com mais freqüência o trabalho de músico. “Isso dificulta muito a nossa caminhada. Mas não vamos desistir nunca”, garante, cobrando mais atuação do poder público e mais empolgação do próprio público local. “Os músicos sergipanos estão muito sozinhos. Não tem uma produção, um apoio, mas são todos bons profissionais que enriquecem a nossa cultura”.

Gilson Sousa

domingo, 5 de abril de 2009

Palpite infeliz – A gafe de Luiz Gonzaga em relação a Djavan



Foi, em minha opinião, a previsão mais errada já feita na história recente da música popular brasileira. No começo da década de 1980, ninguém menos que o Rei do Baião, Luiz Gonzaga (1912-1989), apostou num possível fracasso prematuro na carreira artística de Djavan Caetano Viana, então um jovem alagoano que começava a conquistar espaço na MPB. Isso mesmo. Luiz Gonzaga, que já era à época um dos ídolos musicais de Djavan e inúmeros outros artistas brasileiros que o reverenciam até hoje no cenário da música regional, não botou muita fé no cara que já fazia sucesso com sua ‘Flor de Lis’ e ‘Fato Consumado’.
Aliás, o fato confirmou-se durante uma entrevista concedida a uma emissora de rádio do Recife (PE) em dezembro de 1982. Segundo o Rei do Baião, que ensaiava sua despedida dos palcos, quando o povo acostuma-se com a voz do artista, a tendência dele é migrar em caminho ao fracasso. Uma teoria louca. Senão, o que seria de um Roberto Carlos da vida se isso fosse verdade? Pois muito bem.
Entre devaneios, no meio de uma explicação sobre o fim das parcerias vitoriosas com Humberto Teixeira e Zé Dantas, Luiz Gonzaga achou por bem pegar pesado com Djavan, que naquele ano havia lançado seu quinto LP, Luz. A propósito, um disco apontado pelos críticos como o melhor de todos já feitos pelo alagoano até o momento. Mas vejamos, então, o que disse Gonzagão:
“Nós temos agora um sucesso aqui, surgido recentemente, um nordestino de Alagoas chamado Djavan. É fenomenal, é maravilhoso. Mas ele vai manter esse ritmo de sucesso por cinco, dez ou vinte anos? Não vai. Eu gostaria que isso acontecesse. Mas também o Djavan já começa... primeiro: deixa de viver uma vida simples, já começa a usufruir dos melhores hotéis do país, escolher até o tipo de avião que vai viajar, os empresários, as ‘nêgas’ bonitas que ficam em cima dele. Então começa a cai a coisa”. Pois é. Acreditem se quiser, pois foi justamente isso que expressou Luiz Gonzaga.
Para mim, modesto fã do trabalho de Djavan, além das contradições no pensamento do Mestre Lua, pois ele próprio se beneficiou de várias prerrogativas do mundo artístico, existe uma falta de sensibilidade sem dimensão nessa história contada e gravada para o mundo inteiro ouvir. Luiz Gonzaga começou a fazer sucesso ainda na década de 1950 e até hoje sua voz é querida, respeitada e acalentada pelos brasileiros. A propósito, Gonzagão faleceu em agosto de 1989 e atualmente vende 30% de todos os cd’s de forró em todo o país. E será que ele mesmo apostaria nisso? Certamente não.
Todavia, o que importa dizer é que o palpite infeliz de Luiz Gonzaga em relação a Djavan, que em 2007 lançou Matizes, seu 15º disco, graças a Deus não tem a mínima chance de se concretizar. Vida longa ao mestre das Alagoas.

Gilson Sousa

quarta-feira, 1 de abril de 2009

A moderna cidade das carroças


Ainda que fossem legítimas charretes desfilando charme e formosura pelas ruas da cidade, aí tudo bem, poderíamos ficar orgulhosos e até bater palmas... Mas não é. O que se constata no dia a dia aracajuano, nas diversas ruas e avenidas da cidade, é um número absurdo de carroças de tração animal enfeiando os espaços, atrapalhando o tráfego de veículos, viabilizando acidentes e muitas vezes enchendo de bosta as vias mais importantes desta capital.
Prova disso é que o flagrante da foto é exatamente num dos pontos mais movimentados de Aracaju, nas proximidades do viaduto do DIA. Por ali, sem medo de errar, passam diariamente centenas de carroças puxadas por burros com rabo e sem rabo. Todas entupidas de entulhos fétidos, de aparência troncha, desgovernadas e desestruturadas para servir como meio de transporte de carga. Um acinte à modernidade, é verdade.
E não me venham com essa história de que trata-se apenas de um instrumento de trabalho de homens e mulheres que precisam ganhar a vida com honestidade. Isso é discurso para boi dormir. Porque os cavalos, éguas, jumentos e outros bichinhos que suportam o peso da desgraça, sequer conseguem um descanso. É pau nos lombos mesmo.
Portanto, chega a ser pitoresco, para não dizer ridículo, o grande movimento de carroças traçando as grandes avenidas desta cidade que corre atrás da modernidade. E pelo visto, isso é fato para outros e outros centenários. Quem quiser que se meta à besta.

Gilson Sousa