segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Artista é para estar no meio do povo


Tempos atrás, havia feito para a Folha da Praia uma crônica onde relatava minha satisfação com os inúmeros shows de grandes músicos da MPB que eu vi de graça em praça pública em Sergipe e outros cantos do país. Uma lista imensa, incluindo Djavan, Milton Nascimento, Jorge Benjor, Emilio Santiago.
Agora escrevo para dizer que nesse começo de ano, em Sergipe, vou colecionando uma nova safra de shows em praça pública. Em janeiro vi e vibrei com Vanessa da Mata, Olodum, Lenine, Skank, Daniela Mercury, Toni Garrido, Paralamas do Sucesso. Isso sem contar com uma breve visão da passagem de trios elétricos no Pré-caju com Ivete Sangalo, Chiclete com Banana, Spok Frevo e alguns outros.
E olha que se aquela frase de Milton, na canção Bailes da Vida (todo artista tem que ir aonde o povo está...), fosse verdadeira, a história poderia ser melhor. O problema é que para trazer artistas renomados para shows públicos, alguns poucos cidadãos com acesso ao erário, acabam enchendo os bolsos com propinas e desvios que deixam o espetáculo muito feio. Uma pena.
E para não dizer que não falei nos conterrâneos, em janeiro mesmo foi bacana ver um desfile de feras da música em Sergipe dando ‘palhinhas’ no palco do Viva Ará Café no aniversário de Cleomar Brandi. De forma descontraída, mas com muito profissionalismo, empunharam o violão e soltaram a voz nada menos que Pantera, Cláudio Miguel, Paulo Lobo, Silvio Rocha, Joãozinho Ventura, João Alberto, Heitor Mendonça, Álvaro Muller, além das participações de Lu Muniz, Maynara, Bia, Suyan, Marta & Carla... Tá bom assim?

Gilson Sousa

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

A riqueza veste batina


Longe de mim comprar algum tipo de briga com os poderosos da igreja católica neste país de atitudes dissimuladas. Mas deixar aqui minha indignação com o que considero o extremo da hipocrisia, isso sim, posso fazer. Acompanhei hoje na mídia o lançamento da Campanha da Fraternidade ecumênica 2010, e para minha surpresa o tema é ‘Fraternidade e Economia’. Até aí, tudo bem.
O problema vem com o desenrolar da coisa. “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro”, diz o lema. “Ahhhh!”, digo eu. Como assim? No mundo capitalista em que vivemos, pregar isso é pura balela. E essa igreja aí bem sabe disso. Durante séculos acumula riquezas incalculáveis e vem pra cá dizer que pimenta nos olhos dos outros é refresco. Que é isso, mermão?
Até quando esse modelo de igreja conservadora e alienadora irá dominar mentes e consciências pobres de espírito real? Pelo amor do verdadeiro Deus, quem essa igreja católica pensa que é para lançar tal campanha. Sabemos que são pouquíssimos os sacerdotes que realmente cumprem o tal voto de pobreza. A maioria gosta mesmo é de uma boa mordomia. Então, vamos deixar de hipocrisia e cair na real.
Essa mesma igreja, desde os primórdios, alimentava a idéia de riqueza. Não para os integrantes enquanto cidadãos, mas sim para o patrimônio da instituição, capaz de impor e intimidar qualquer um que se oponha ao sistema deles. Eles sabem muito bem que ninguém nesse mundo de hoje vive à margem da economia. E ai dela própria se não apelasse constantemente aos dizimistas para manutenção dos seus cofres. Portanto, é duro dormir com um barulho desses.
E antes que alguém pense que sou um ateu desvairado, digo que não. Sou um cristão, sim senhor, convicto de mim, temente a Deus, mas que não preciso seguir regras e conceitos desse grupo mesquinho repleto de homens hipócritas no comando. Ou será que a partir de agora esses senhores astutos que vestem batina irão abrir mão de suas riquezas ocultas e passar a ajudar materialmente os miseráveis que só contam com a ajuda de Deus para sobreviver nesse mundo cruel? Aí eu quero ver.

Gilson Sousa

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Na rua o carnaval fica bem melhor


Pra mim, o melhor acontecimento deste carnaval que para a maioria dos mortais acaba nesta noite foi a volta magistral das festas de rua reunindo milhões de pessoas em criativos blocos carnavalescos país afora. Foi bacana ver ruas e avenidas do Rio de Janeiro tomadas por foliões atrás de bandinhas de frevo e coisas do gênero. Há tempos isso não acontecia por ali, eu bem sei.
Em Pernambuco, o carnaval de rua sempre foi forte. Na Bahia também, só que ali existem aqueles blocos em que os foliões precisam desembolsar altas quantias em dinheiro para brincar dentro de uma corda. É o jeito. Em vários outros estados brasileiros, pelo o que acompanhei nos telejornais, a folia de rua veio forte este ano. Até aqui em Sergipe, quem diria.
Tirando o tradicional carnaval de rua em Neópolis, cidades como Aracaju, Canindé, São Cristóvão, Porto da Folha, Estância e mais algumas outras se firmaram este ano colocando dezenas de blocos na rua. Nada muito profissional, afinal isso aí não é o nosso forte. Mas para quem gosta de curtir a festa de momo travestido de mulher ou todo melado de talco, digo que o resgate do carnaval de rua aqui e acolá valeu à pena em todos os sentidos. Viva o povo na rua, mesmo que seja somente para festejar as dádivas da carne.

Gilson Sousa

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Desalento


Fiz foi bem não botar fio do cabrunco nenhum no mundo. Repare o fio de Sandoval. Menino teve de tudo o que queria. Pasta de dente das boas, pente fino de osso, roupa branca de escola e até carrinho de rolimão. E veja no que deu. Eu mesmo não tive quase nada disso quando era guri. Ralava era muito. Graças a Deus. Não pisava no calo de seu ninguém, e só pegava no que era meu. Nem precisava recomendar.
Agora fico vendo esse menino de Sandoval. Coitado. Aliás, coitado dos dois. Um porque é frouxo outro porque é safado. Quem já seu viu acarinhar tanto um fio e depois receber tapa na cara. Foi isso o que povo andou dizendo aqui na rua. Aquele menino, todo metido, se misturou com gente que não presta e deu no que deu. Vive atolado num tal de crack e até a pobre da mãe quer matar. Pelo menos de preocupação. Arrepare, se eu posso com isso.
Sei não. Deve de ser duro pra um pai e uma mãe acompanhar um troço desses. Por isso acho que fiz foi bem não botar fio do cabrunco nenhum no mundo Mimaram demais o capetinha, quem sabe. Agora agüente. A família está quase destruída. Um desalento. Ontem mesmo Arlete, a irmã mais nova, disse que não agüentava mais. Os tios não querem nem saber. É um tal de desaparecer coisa de dentro de casa. Sei não. Só sei que esse crack é uma desgrama.
A propósito, você viu no jornal de hoje. A polícia matou aquele rapaz que de vez em quando andava com o fio de Sandoval. Também pudera. Dizem que o cara vendia drogas pra criança, até. Mas o mundo vai ficar bem melhor sem ele. O problema agora é dar providência pros fio dos outros. Quase ninguém está querendo encarar isso, mas também pouca gente está descruzando os braços. E enquanto isso, muita gente boa vai perdendo a guerra para as drogas. É uma peste mesmo.

Gilson Sousa

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Plataforma quebrada, sem voz nem vento


Socorro, alguém me ajude. O trem passou depressa e não tenho como chegar na próxima estação. Tá frio aqui dentro de mim. Tá feio lá fora. Nunca estive tão só. Creio não ter forças pra correr. E assim fico amargo. Pelejando por uma ajuda. É quando aparece a tal dor invisível. Inevitável não chorar. Pois o trem está distante. Com seus vagões abarrotados de hipocrisia e cinismo. E eu queria estar lá. Assim sobreviveria um pouco mais, quem sabe.
Boi infeliz. Por que ando tão triste? É preciso chorar, ao menos uma vez. Lembrar uma música qualquer. Amaldiçoar a solidão e aceitar o peso dos braços. O trem da vida não conta o tempo. Não perde escala. Também por isso peço socorro. Ninguém me vê como sou. Um ser claramente incompleto, vulnerável. Lobo solitário, refém da tormenta. Vagando na plataforma quebrada. Alguém me ajude, por caridade, que seja.

Gilson Sousa

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Quem a chuva vai matar hoje em São Paulo?


São mais de 40 milhões de habitantes em todo o Estado de São Paulo. Exatamente 645 municípios, sendo que em muitos deles há 43 dias não para de chover. Até ontem à noite, 74 pessoas já tinham perdido a vida por conta desse caos que se arrasta desde o dia 1º de dezembro de 2009. Aí eu pergunto: quem a chuva vai matar hoje em São Paulo?
Imagino o temor dos paulistanos ao verem diariamente as previsões do tempo divulgadas em telejornais. Eles devem tremer. O que não é para menos. Ainda mais porque constatamos daqui que autoridade nenhuma de lá vem tomando providências para mudar esse quadro de calamidade. Enquanto uma minoria burguesa se acomoda em luxuosas mansões, a grande maioria proletária se estrepa entre esgotos, matagais e lixões.
Então, quem vai morrer hoje?

Gilson Sousa

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Enfeite na boneca dos outros


Em termos midiáticos, se depender da chamada grande imprensa nacional, nós brasileiros continuaremos pertencendo ao Terceiro Mundo para sempre. Na questão da música isso fica bem claro quando jornais impressos e emissoras de televisão abrem generosos espaços para divulgar reportagens sobre a 52ª edição do Grammy, segundo eles, o Oscar da música. Mas que música?
Até a década de 1980 éramos mesmo bombardeados com a cultura enlatada que vinha do exterior. Ficávamos praticamente de mãos atadas. Nossos ídolos eram estrangeiros porque mal conhecíamos o que se fazia por aqui. E o que se fazia por aqui era mal produzido e mal divulgado porque não havia espaço nem tecnologia para tal feito. Mas hoje não.
Ficar agora reverenciando uma tal Beyoncé e outra tal Taylor Swift, cantora country, não é bom negócio para quem pretende conquistar mais respeito e admiração mundo afora. Por aqui, não preciso nem falar, existem centenas de artistas mais ‘poderosos’ que esses. Se falta produção adequada, sobra talento. Então creio que não precisaríamos abrir tanto espaço para aquele povo de fora. Digo isso sem casuísmo algum.
Pelo contrário. Compreendo que vivemos num mundo globalizado, mas nossos aspectos internos precisam ter mais peso no bolo da informação nacional. E é nessa hora que tiro o chapéu para o bairrismo baiano. Lá, em qualquer circunstância, primeiro eles. E estão certíssimos.
Mas para sorte nossa – e azar de alguns poucos que deixam de ganhar muito dinheiro – a pirataria de cd’s e dvd’s populares ajuda a amenizar isso. Obras de artistas brasileiros, bons e ruins, são facilmente adquiridas e imensamente divulgadas país afora. Um bom começo, mesmo que controverso.
Em tempo: nesse tal Grammy nenhum brasileiro foi contemplado, mesmo existindo uma subcategoria chamada de ‘Música Latina’. É mole?

Gilson Sousa