quarta-feira, 19 de agosto de 2009

No meio da passeata


Chico Ribeiro Neto (chicoribe@gmail.com) é jornalista

Aconteceu há uma semana. Tive que ir à Mouraria e – como sempre vou ao Centro de Salvador de ônibus e aparece muita lembrança -, resolvi voltar andando pela Avenida Joana Angélica. Foi quando, defronte ao Colégio Central, tive que passar pelo meio de uma passeata. Foi um verdadeiro ziguezague de recordações.
Há 40 anos vivíamos numa ditadura militar e o Brasil fervilhava de manifestações. Em 1966 eu era expulso do Central juntamente com os integrantes do Gateb, o Grupo Amador de Teatro Estudantil da Bahia, depois que foi censurada a peça “Aventuras e Desventuras de um Estudante”, de Carlos Sarno, o que desencadeou uma série de protestos estudantis, culminando com uma greve geral estudantil, secundarista e universitária.
Depois da peça censurada, resolvemos montá-la no Restaurante Universitário, na Vitória. As mesas juntas formavam o palco. Eu era o narrador e abria a peça. Na minha primeira fala, começou um corre-corre. Agentes do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) comandaram a repressão. Me refugiei no quarto de um dos estudantes, enquanto a confusão aumentava e os policiais espancavam. A repressão fechou o cerco na cidade e alguns colegas do Gateb foram torturados e presos.
Nossas passeatas de 66 gritavam por liberdade, “abaixo a ditadura”, “abaixo o acordo MEC-Usaid”. Hoje, na porta do Central, as palavras de ordem são pelo passe livre de ônibus e também por maiores facilidades de acesso ao ensino superior.
Os tempos mudaram, mas os ideais são os mesmos. A passeata ficou mais alegre, talvez. Meninas dançavam axé à frente do carro de som. Tive vontade de pedir o microfone a um deles e gritar: “A luta continua, eu também gritei nas ruas, eu também tive esperança de um país melhor, e me esforço para continuar tendo”. Me contive e apressei os passos à frente da passeata. A cabeça dava voltas no passado.

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